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ANO NOVO, VIDA NOVA?

-Renata Fabiana Santos Silva-


Ao término de cada ano civil passamos por um período reflexivo. Examinamos a nossa relação com o tempo em busca de uma renovação. Este é o momento em que atribuímos a obrigação de fazer um balanço das nossas vidas, listando conquistas, pendências, fracassos, bem como os desafios para o ano que chega. Lapso temporal importantíssimo, necessário para observarmos o passado e apreendermos com as nossas experiências.


Como em um jogo de vídeo game, em que o alcance de uma nova fase implica em mais uma vida, zeramos o ano e ganhamos uma nova oportunidade para viver aquilo que deixamos de viver ou que sonhávamos em desfrutar. Mas para começar esta nova fase do game, é preciso adquirir suplementos para garantir as realizações.


Então, potencializamos a magia da transformação pulando ondas, comendo uvas e lentilhas, usando roupas com cores representativas dos nossos desejos. Ritual completo. E sempre atribuindo a um elemento externo a responsabilidade pela transformação das nossas vidas.


Mas o que verdadeiramente importa é que tudo será novo a partir do dia 1º de janeiro, não é? Mas será que esta vida novinha, zeradinha, começa mesmo nos primeiros minutos do ano novo, como em um passe de mágica? No desenrolar dos primeiros dias do ano percebemos que não é exatamente desta forma. As postergações se iniciam. Das atividades mais simples como iniciar uma dieta, praticar atividade física, agendar o check-up que está atrasado há anos; aos planejamentos mais complexos como a redefinição da carreira, mudar de cidade ou país, iniciar ou retornar a vida acadêmica.


E o ano novo ganha um novo marco temporal, que entre nós brasileiros é o Carnaval. Como implementar uma nova vida, repleta de desafios, antes de se entregar a todos os prazeres físicos e etílicos ou até mesmo ao ócio momesco? Impossível! Este obstáculo, quase intransponível – o carnaval – será o novo mote para repactuarmos o início do novo ano. E seguimos com este ciclo de novos pactos, até mais uma vez alcançar o 31 de dezembro, e reativar mais uma vida do game. Mais um “mito de calendário”, parafraseando o grande Carlos Drummond de Andrade.


Em verdade, não precisamos de um ano novo para transformar a nossa existência, o que precisamos mesmo é escolher esta transformação e trabalhar com foco e determinação para alcançá-la. O tempo é um importante aliado neste processo, mas a transformação depende tão somente de nós. O nosso novo ano pode começar qualquer dia, basta que decidamos que assim será, porque assim desejamos.




Mas há de lembrar as mensagens de Lulu Santos de que “o tempo voa, escorre pelas mãos, mesmo sem se sentir” e “não há tempo que volte” (Tempos Modernos, 1982) porque, como bem dizia o eterno Cazuza, “o tempo não para” (O tempo não para, 1988). Ainda seguindo o músico/poeta dos anos 80, não podemos deixar “o futuro repetir o passado” (O tempo não para, 1988)  porque nós não “temos todo o tempo do mundo” (Tempo Perdido, 1986) por mais que tenhamos uma vida inteira pela frente, como bem indicava o saudoso Renato Russo[1].


Portanto, iniciemos o nosso ano novo independentemente de marcos e atribuindo a nós mesmos o potencial e a responsabilidade para a mudança. Adotando, pois, a receita de Ano Novo do inesquecível Drummond: “É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre”. Assim, teremos, verdadeiramente, um ano novo e uma vida nova. Feliz ano novo!

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[1] Na música “Tempo Perdido”,  a referência a “temos todo tempo do mundo” é uma ironia do autor, uma vez que o contexto da letra nos leva a conclusão de que não podemos desperdiçar o tempo que temos, no sentido de que cada momento é único e não retorna.


 

Renata Fabiana Santos Silva é Procuradora do Estado da Bahia. Doutora em Direito pela Universidade de Sevilha (Espanha). Mestra em Direito Público pela Universidade de Sevilha (Espanha). Pós-graduada em Fundamentos de Direito Público Global pela Universidade Da Corunha. Membro do IBAP.



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