Fortaleza, 15 de setembro de 2019
Ao cumprimentá-lo, gostaríamos de lhe informar que, no dia 13 de setembro por volta das 22h30, Juan Ferreira dos Santos, de apenas 14 anos, foi assassinado por um policial militar, no Bairro Vicente Pinzón, na Praça do Mirante. Ele estava reunido com amigos quando foram abordados por policiais militares que afirmam tê-los visto em “atitude suspeita”. Seus policiais afirmam ainda que foram recebidos com pedradas e, por isso, realizaram tiros para o chão – procedimento incompatível com as técnicas de abordagem policial em qualquer lugar do mundo. Um dos tiros “para o chão” acertou a cabeça de Juan por trás e o levou a óbito.
Sábado, dia 14 de setembro, essa criança foi enterrada no Cemitério do Bom Jardim por volta das 10h50, sem honras ou conforto da sua parte. A Polícia Militar (PM) afirma que o policial foi preso em flagrante, o que representa o mínimo em um assassinato a sangue frio sem direito a defesa. Apesar da prisão imediata do policial, o que mais nos assusta nesse, como em outros casos, é o seu silêncio. Percorremos notícias de jornal, suas redes pessoais e páginas institucionais do governo sem que uma única palavra seja dita por você sobre o caso. Não sabemos se o Senhor tem a dimensão do significado político de tal atitude. Seu silêncio é o retrato da conivência diante da ação violenta de policiais que atuam sob o seu comando e liderança. Juan não é a primeira e nem será última criança morta pela força policial da qual o Senhor é principal responsável.
Nos dias 11 e 12 de novembro de 2015, a PMCE entrou no bairro do Curió, na Grande Messejana, e matou onze pessoas, entre elas adolescentes. Em 7 de dezembro de 2018, policiais atiraram para matar contra uma família que era refém, em um momento, no qual a situação de assalto para qual foram acionados já estava controlada e não havia ameaça alguma contra eles. Uma criança de apenas 6 anos é morta em operação no Bom Jardim. Mães, pais, crianças e adolescentes, em sua maioria pretos e pobres, têm sido vítimas constantes de ações violentas da PMCE. Essas ações não são isoladas, mas parte de um projeto de poder no qual o Senhor está envolvido. Mesmo sem expor de maneira truculenta sua opção pela violência policial, como faz o Presidente da República e vários dos seus adversários políticos no Ceará, o Senhor claramente se rendeu às forças reacionárias. É evidente pelas escolhas do seu Secretário de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) e Administração Penitenciária que o Senhor comunga com as ideias de guerra ao crime e desrespeito aos direitos humanos.
Sua falta de atitude e condenação à violência policial tornou seu governo responsável por cada um dos crimes cometidos por policiais convictos da violência como meio de fazer segurança pública. Suas forças policiais acreditam que segurança pública se faz sem respeito aos direitos humanos e promovem o racismo ao enquadrar qualquer preto e pobre da periferia na categoria “suspeito”. O morticínio promovido pelos seus policiais ao longo da sua gestão é uma experiência necropolítica de fazer e deixar morrer crianças e adolescentes nas periferias do Ceará.
Seu silêncio é uma ação política e suas palavras de incentivo, ao trabalho que está sendo feito, revelam a sua concordância com o racismo institucional que tem feito com que as armas de seus policiais disparem sempre contra os mesmos corpos pretos e pobres das nossas periferias. Não aguentamos mais e exigimos sua posição como representante do povo cearense na mais importante esfera do poder estadual. Cumpra seu dever e ofereça à população sua posição diante dos massacres promovidos pelas forças policiais sob sua responsabilidade. É o mínimo que se pode esperar de um chefe de Estado.
Primeiro torturaram suspeitos. Depois torturaram e mataram homens e mulheres. Agora matam crianças e adolescentes pelas costas. E depois Camilo?
Atenciosamente,
FÓRUM POPULAR DE SEGURANÇA PÚBLICA
Organizações, movimentos e coletivos que assinam esta Carta:
ABONG Ceará
Acervo Mucuripe
Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente- ANCED
Associação Santos Dias
Campanha Nacional Criança não é de Rua
Centro de Assessoria Jurídica Popular- CAJU/UFC
Centro de Defesa da Criança e do Adolescente- CEDECA Ceará
Coletivo Flor no Asfalto
Coletivo Pretas Kariri
Comissão de Direitos Humanos- OAB Ceará
Conselho Nova Vida- CONVIDA
Diaconia
Fórum Cearense de Mulheres / AMB
Fórum DCA Ceará
Fórum Popular de Segurança Pública do Ceará
Fórum Popular de Segurança Pública do Nordeste
Frente de Luta por Moradia Digna
Fundação Marcos de Bruim
Grupo de Desenvolvimento Familiar – GDFAM
Instituto Negra do Ceará- INEGRA
Laboratório de Estudos da Cidade- LEC/UFC
LEHAB/UFC
Mães e familiares do Curió
MJPOP
Movimento Cada Vida Importa
Movimento de Base Popular Praia do Futuro
Movimento de Juventude Afronte!
Movimento dos Círculos Populares
Movimento dos Conselhos Populares- MCP
Movimento Hip Hop Nós por Nós
Núcleo de Assessoria Jurídica Popular e Comunitária- NAJUC
O Pequeno Nazareno- OPN
OPA- Organização Popular
Pastoral do Menor
Projeto de Extensão Traficando Saberes
Rede de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável do Grande Bom Jardim
Rede de Mulheres Negras do Ceará
Rede de Observatórios da Segurança
Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares - RENAAP
Tambores de Safo
VIESES- UFC
Visão Mundial
Vozão Antifa
Vozes de Mães e Familiares do Socioeducativo e Prisional do Ceará
ZEIS Pici
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