top of page

SBCE e Créditos de Carbono na Lei n.º 15.042, de 11 dezembro de 2024

- Ibraim Rocha -


A Lei Federal n.º 15.042, de 11 de dezembro de 2024, cujo art. 1º conceitua o que é o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), introduz no ordenamento jurídico brasileiro um sistema regulado de métodos que permitem a comercialização de redução de emissões de gases de efeito estufa. A lei delimita os setores a ele submetidos, sempre sob a responsabilidade de operadores, e, por exclusão expressa, não permite a inclusão do setor agropecuário. O setor agroflorestal somente pode ser incluído se utilizar as metodologias aprovadas pelo novo sistema, devendo, sempre e em todo caso, estar registrados para que se constitua a Cota Brasileira de Emissões (CB ou CBE) e o Certificado de Redução ou Remoção Verificada de Emissões (CRVEs).


O art. 2º apresenta definições dos institutos que regem o SBCE, que é um modelo de cap and trade, segundo metodologias específicas por setor. Esse artigo distingue o SBCE dos Créditos de Carbono, que decorrem de efetiva retenção, redução de emissões ou de remoção, preservação ou reflorestamento; de sistemas agrícolas e pecuários mais eficientes; da preservação florestal; do manejo sustentável de florestas; da recuperação da vegetação nativa; da restauração ecológica; do reflorestamento; e do incremento de estoques de carbono em solos agrícolas e pastagens, submetidos a metodologias nacionais ou internacionais que adotem critérios e regras para mensuração, relato e verificação de emissões, externos ao SBCE.


Dentro dessa dualidade de sistemas presentes na mesma lei, há um aspecto positivo: a norma afasta a falsa premissa de que o chamado mercado voluntário de crédito de carbono não era passível de ser normatizado. A diferença, quando se diz que o SBCE é regulado, refere-se ao fato de que ele exige sempre uma metodologia rigorosa e específica, aprovada pelos mecanismos previstos na lei, o que não se exige para o mercado voluntário. Ainda assim, o mercado voluntário também deve seguir metodologia de avaliação dos resultados.


Um avanço positivo é que o Capítulo IV da Lei n.º 15.042/2024 prevê a chamada Oferta Voluntária de Crédito de Carbono, nos artigos 42 a 46, normatizando o que é esse mercado. O art. 42 prevê que os créditos de carbono são gerados a partir de projetos ou programas que impliquem redução de emissão ou remoção de GEE e poderão ser ofertados, originariamente, no mercado voluntário, por qualquer gerador ou desenvolvedor de projeto de crédito de carbono que seja titular dos créditos, ou por ente público desenvolvedor de programas jurisdicionais e projetos públicos de crédito de carbono.


A Lei n.º 15.042/2024 tem apenas uma regra de repartição de benefícios no SBCE, prevista no art. 28, onde 15% vai para a operacionalização e manutenção do SBCE, no mínimo 75% para o Fundo Nacional sobre Mudança Climática, a serem utilizados no financiamento de investimentos para a descarbonização das atividades, das fontes e das instalações reguladas, e no mínimo 5% para a contribuição à compensação dos povos indígenas e das comunidades tradicionais pela conservação da vegetação nativa e dos serviços ecossistêmicos.


Não existe uma regulamentação expressa da repartição de benefícios sobre Programas Jurisdicionais de REDD+ Abordagem de Mercado ou Programas Estatais de REDD+ Abordagem de Não Mercado, que, em linhas gerais, são projetos de carbono decorrentes da conservação ou restauração de atividades florestais em âmbito estadual ou nacional. Como essa regulamentação é ausente, penso que deve ser aplicada por analogia a regra citada como parâmetro mínimo nesses projetos e programas, para a destinação de repartição de benefícios a indígenas e outras comunidades tradicionais.


Alerta-se, entretanto, que as regras do art. 47, I, “b”, preveem, no que tange aos povos indígenas e comunidades tradicionais, a inclusão de cláusula contratual que garanta a reparação justa e equitativa e a gestão participativa dos benefícios monetários derivados da comercialização dos créditos de carbono e dos CRVEs. Esse artigo se refere a projetos desenvolvidos nas terras tradicionalmente ocupadas por esses povos, com os benefícios depositados em conta específica, assegurando o direito a pelo menos 50% dos créditos de carbono ou CRVEs decorrentes de projetos de remoção de GEE e o direito a pelo menos 70% dos créditos de carbono ou CRVEs decorrentes de projetos de REDD+ com abordagem de mercado. Esses casos configuram uma regulação específica, similar a um contrato agrário, sobre terras já destinadas a essas comunidades, estando fora da metodologia do SBCE.


No conjunto, fica evidente que o SBCE e o modelo de comércio de créditos de carbono avançaram na definição de aspectos técnicos para evitar muitas incertezas. Contudo, apenas políticas públicas concretas permitirão dar eficácia a um modelo mais justo e adequado na repartição de benefícios. Ainda que a lei traga regras básicas essenciais, não se pode ignorar que ela segue o caminho da financeirização da natureza. No entanto, não se pode negar que representa um avanço importante para o acesso a recursos destinados às boas práticas ambientais.


 

Ibraim Rocha é Procurador do Estado do Pará, Mestre em Direito Processual Civil e Doutor em Direitos Humanos e Meio Ambiente. Membro do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública e colunista da Revista Pub Diálogos Interdisciplinares. Sua coluna é publicada sempre no dia 20 de cada mês.





32 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page