-LUIZ SOARES DE LIMA-
O poeta, filósofo e jurisconsulto santista, Sérgio Sérvulo da Cunha, um dos derradeiros humanistas de nomeada, nos deixou. Todavia, seu encantamento nos tornou mais encantados .
Isso porque , acho, ele nos ensinou a viver e a morrer.
Arrisco dizer: ensinou isso a todos e a todas com quem conviveu.
Ensinou a gente a escutar, quando seu silêncio ensurdecedor nos envolvia atentamente.
Ensinou, sem esboçar gesto ou palavra, a ser altivo, grande, mas, sobretudo, humilde.
Ensinou a olhar para as pessoas, para as coisas e para tudo que nos cercava de uma forma direta. Não enviesada. Não se entortava ao olhar. Olhava com reflexão. Olhava tranquilamente e sem medo para o outro e para a outra. Sem tramelas. Sem segundas intenções.
Ensinou a respeitar. Nunca a querer ser respeitado. Não precisava disso, por óbvio.
Tinha-se, é certo, por parte de muitos de nós, um pouco de receio de não ser tão gigante como ele. Mas, Sérgio Sérvulo nunca nos disse isso . Tenho certeza de que ele me entenderia. Compreensão ele tinha demais da conta sô. Compreendia a todos e todas.
Se a compreensão pudesse ser ensinada, Sérgio, decerto, foi o ensinante.
Talvez, tivesse uma certeza que, parecia, momentaneamente, entristecê-lo. Não queria apenas ler o mundo, desejava e lutava para transformá-lo; para deixá-lo melhor para todos nós. Trabalhou para isso. Mas, sentia que o socialismo humanista derrapava. Sentia isso. Não o falava pra mim. Ora, queria ter dito a ele que o socialismo humanista sofria, parecia definhar, mas sobreviveria. Sérgio sabia-o ( esse cair) circunstancial. Em outras palavras, apesar desta pandemia, a dura e burra circunstância era e é um paralelepípedo em nossas cabeças, mas isso não o impedia de dizer em alto e bom som: sejamos otimistas. porque o futuro grandioso espera a todos e todas , à maneira do que foi escrito pelo filósofo espanhol Ortega Y Gasset “eu sou eu e minha circunstância e se não a salvo eu não me salvo”, que fortemente soava em nossos ouvidos e com certeza nos ouvidos do Sérgio, que lutava pelo sócio-humanismo logo que rompia a manhã e muitas manhãs foram se somando.
E, as manhãs somadas pesam. Isso é fato. Sérgio mais do que ninguém sabia quanto isso era um duro fato. Um pesadíssimo monolito que carregamos montanha acima para jogarmos despenhadeiro abaixo. E, nada obstante, como escreveu o filósofo italiano, Pietro Ubaldi: “somos o infinito aprisionados no finito”. Pietro Ubaldi nos deixou há quase 50 anos em nossa vizinha cidade calunga, não esqueçamos dele.
Sérgio Sérvulo, o Sérgio Paolozzi, por sua vez, relembremos, era e é um poeta modernista e, obviamente, enquanto poeta, poderia dispensar os versos românticos de seu colega das arcadas, Álvares de Azevedo: “...quando eu morrer/ enterrem o meu corpo na floresta de homens esquecida/ ponham uma cruz/ escrevam nela: foi poeta, sonhou e amou na vida”.
Nosso jurista, filósofo e poeta não precisava que escrevessem na cruz seus mistérios líricos.
Ele deixou reflexões jurídicas, filosóficas e seus poemas à farta.
Sérgio Sérvulo da Cunha, o jurista socialista , revolucionário e o filósofo , deixou-nos mais encantados quando poeta. Mostrou-se um paolozziano lírico.
E, a floresta dos homens continua por nós esquecida, mas ela, podemos ter certeza disso, serenamente nos aguarda.
O texto homenageia o Sérgio Sérvulo. É certo que a vida, de qualquer um de nós, não cabe em palavras. Por mais que a gente goste delas. Como escreveu João Cabral: " Sei que escrever no papel/ é mais fácil que na vida/o papel é página pura e passiva/ não é como a vida/Inquieta, explosiva. "
Luiz Soares de Lima é Procurador do Município de Santos, foi Procurador Geral da FUNAI, graduado em Filosofia e Direito e associado do IBAP
Eu não seria capaz de dizer nada melhor do que disse o Luiz acerca do amigo querido, que conheci ao apresentar dois trabalhos na Tribuna Livre da 14ª Conferência Nacional da OAB (1992), em Vitória/ES.
Maravilhosa e poética homenagem a esta pessoa magnífica que foi Sérgio Servulo da Cunha. Parabéns, Luiz!