- Inês Virgínia Prado Soares -
Em recente artigo publicado na prestigiosa Revista de Direito da Cidade (v.08, n°4), Marcílio Franca, logo no título, refere-se ao grafite como a “pele da cidade”. O sentido figurado emprestado a essa arte de rua pelo autor do texto, além de um belo elogio às alegres pinturas que tomam o contexto urbano, é também uma instigante provocação: afinal, as cidades sem grafites são cidades em carne viva, sem uma pele que as proteja? E se for assim, de que ou quem os grafites protegem os cenários urbanos?
As peles em carne viva não passam despercebidas - causam repulsa, compaixão, pena, dor. Já as peles da cidade podem nem ser notadas, são parte da paisagem, do viver, estão ali para reparamos com atenção, quando e se quisermos. Precisamos dessas peles bem viçosas e, ao mesmo tempo, não queremos o incômodo de sequer imaginar uma pele em carne viva.
Mas, de vez em quando, as feridas surgem nas paredes das cidades!
A supressão de grafites que faziam parte da paisagem urbana da cidade de São Paulo foi uma das primeiras medidas adotadas por João Dória quando assumiu a prefeitura em janeiro deste ano. Essa “limpeza” foi uma das tarefas da operação Cidade Linda e causou enorme polêmica, expondo a difícil relação que o grafite, como arte, mantém com o Poder Público.
Entre o cinza e a perspectiva de tornar a cidade bela e limpa, há um desconforto de grande parte da população, que pressente, com razão, que as tintas carregadas nessa discussão destoam cenário urbano e do direito que todos temos de ver arte quando passamos distraídos ou apressados pelos espaços comuns das cidades. Além do silêncio acerca dos direitos culturais dos cidadãos que vivem na cidade de São Paulo, há uma tentativa de confundir grafite com ações de degradação. Mas é exatamente o contrário!
Inês Virgínia Prado Soares é Desembargadora Federal
Comments