-IBRAIM ROCHA-
A Constituição Federal de 1988, no seu artigo 215, parágrafo 1°, estabelece o princípio que a cultura negra integra o processo civilizatório nacional e este princípio bastaria em conjunto com outros princípios constitucionais para fundamentar políticas de integração plena desta comunidade no exercício da cidadania.
Celebra-se no dia 20 de novembro de 2024, o primeiro feriado nacional da Consciência Negra, instituído pela Lei Federal nº 14.759, de 21 de dezembro de 2023, que declara ser para a “celebração do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra”. Mas, afinal, o que é tal celebração ?
Muito se diz que feriado normal no Brasil é quando se sabe que é folga e não se faz nada, mas no geral as datas nacionais tem conexão com datas que rememoram atos das elites, tal como o independência do Brasil, e a Proclamação da República, sendo que este seria o primeiro feriado nacional derivado de uma real luta de resistência, originário da luta dos negros por liberdade, exemplificada pelo dia da morte de Zumbi, que liderou o Quilombo dos Palmares, negativo, da história oficial do 13 de maio, data da abolição da escravatura.
Na minha história pessoal sempre odiei o 13 de maio, sempre ouvia as piadinhas, que se não fosse a princesa Izabel, ainda estaria na senzala, ou mesmo quando era “celebrado” nas escolas, lembrava a cena triste de ver inclusive colegas brancos, com a cara pintada de preto, uma cena patética.
O 20 de novembro deverá ser um momento de reflexão, de ressignificar as lutas pela liberdade, pensar que a escala de trabalho 6X1 também é uma forma de escravidão, e que a morte nas favelas dos jovens negros, majoritária e desumana, é a atualidade do pelourinho, quando se verifica que segundo o Atlas da Violência 2024, que traz os dados de mortes por homicídio no país em 2022, revelou que quarenta e seis mil, quatrocentas e nove pessoas foram assassinadas no Brasil, e que desse total, 76,5% cento tiveram como vítima pessoas pretas e pardas.
Certamente esta Lei não viria no Governo Fascista de Bolsonaro, que aliás fez passar em branco o decênio do Estatuto da Igualdade Racial, instituído pela Lei Federal n° 12.288, de 20 de julho de 2010, em 2020, e que pelo contrário o Presidente da Fundação Palmares Sergio Camargo, marcou a sua gestão por ter realizado um trabalho revisionista sistemático da experiência negra com o retrocesso de valorização da abolição da escravatura.
Mas não se deve acreditar uma Lei Nacional paga a dívida, pelo contrário, ela deve ser o marco do nunca esquecer, como o Governo Federal atual deixou passar a história da ditadura militar, não podemos deixar que a data negra caia no folclorismo, mas que seja um marco para do reconhecimento do fato histórico que a desigualdade racial no Brasil ocorre contra os afro-descentes, cujos antepassados foram objeto de leis escravistas aplicadas no território nacional, que os excluíam da noção de sujeito de direitos, dentro de uma política de Estado, e, que igualmente merece uma política de Estado de reparação.
Este o ano a redação do Enem teve como tema “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil”, assim, o primeiro ponto desta porfia é reconhecer que o Estado deve parar de nos matar, prendendo e julgando os capitães do mato, que ainda atuam em todas as frentes contra a liberdade do povo negro.
Vida o primeiro Feriado Nacional da Consciência Negra!
IBRAIM ROCHA, Advogado, Mestre em processo civil/UFPA, Doutor em Direitos Humanos e Meio Ambiente/UFPA, Procurador do Estado do Pará e membro do IBAP.
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